sexta-feira, 1 de abril de 2011

PESQUISAS DO GRUPO

Nota introdutória

Após nossa leitura da semana, resolvi pesquisar sobre os movimentos literários na qual Fernando Pessoa participou (Saudosismo, paulismo, intersseccionismo e sensacionismo). Então, para não ficarmos na superficialidade do texto do Massaud Moisés, leiam e aprofundem seus conhecimentos...

Saudosismo

Movimento literário, religioso e filosófico, nascido do impulso dos intelectuais que constituíram a "Renascença Portuguesa", uma sociedade surgida, após a instauração da República, de um projeto de promoção da cultura nacional cumprido na edição, na fundação de universidades populares, na realização de cursos e colóquios, na constituição de bibliotecas, entre outras ações, e que tinha como órgão de trabalho e ideário da sociedade a revista A Águia, publicação que reunirá em torno deste programa de revitalização social e cultural a colaboração de Teixeira de Pascoaes, Mário Beirão, Leonardo Coimbra, Jaime Cortesão, Afonso Duarte, António Carneiro, Sant'Anna Dionísio, Hernâni Cidade, Adolfo Casais Monteiro, Augusto Casimiro, Augusto Gil, Afonso Lopes Vieira, Raul Proença, António Sérgio, António Correia de Oliveira, Manuel Laranjeira, Sampaio Bruno, entre outros.

Inicialmente designada "Renascença Lusitana", a sociedade, em manifesto redigido por Teixeira de Pascoaes, publicado em fevereiro de 1914 em A Vida Portuguesa (cf. GUIMARÃES, Fernando - Poética do Saudosismo, Lisboa, 1988, pp. 61-63), proclama como objetivos: "combater as influências contrárias ao nosso carácter étnico, inimigas da nossa autonomia espiritual, e provocar, por todos os meios de que se serve a inteligência humana, o aparecimento de novas forças morais orientadoras e educadoras do povo, que sejam essencialmente lusitanas." Arreigadamente nacionalista, profetizador de um ressurgimento nacional, Pascoaes encontrará na "saudade" o carácter definidor da especificidade do ser português. Para o autor de "Marânus", "quem surpreender a alma portuguesa, nas suas manifestações sentimentais mais íntimas e delicadas, vê que existe nela, embora sob uma forma difusa e caótica, a matéria de uma nova religião, tomando-se a palavra religião como querendo significar a ansiedade poética das almas para a perfeição moral, para a beleza eterna, para o mistério da vida... Ora a alma portuguesa sente esta ansiedade de uma maneira própria e original, o que se nota facilmente analisando os cantos populares, as lendas, a linguagem do povo, a obra de alguns poetas e artistas e, sobretudo, a suprema criação sentimental da Raça - a Saudade!" (id. ibi., p. 62).

"Verbo do novo mundo português", a saudade é definida por Pascoaes como "o próprio sangue espiritual da Raça, o seu estigma divino, o seu perfil eterno" e seria através da revelação desta "saudade no seu sentido profundo, verdadeiro, essencial, isto é, o sentimento-ideia, a emoção-reflectida, onde tudo o que existe, corpo e alma, dor e alegria, amor e desejo, terra e céu, atinge a sua unidade divina", da "Saudade vista na sua essência religiosa", que surtiria a "grandeza do momento atual da Raça Portuguesa" (Pascoaes, n.° 1, 2.a série, p. 1), representada maximamente pelos seus poetas, em quem a saudade se revelou. Herdeira do nacionalismo legado pelo neogarrettismo e neorromantismo, e imbuída pela necessidade de ação cívica que decorrera da revolução republicana, a estética saudosista influencia poetas como Pascoaes, Afonso Lopes Vieira, Augusto Casimiro, Jaime Cortesão, Mário Beirão, Afonso Duarte ou Alfredo Brochado e manifesta-se por traços poéticos como as "alegorias referidas à Pátria-Saudade ou uma transfiguração messiânica, as correspondências e a realização verbal do inefável, os símbolos de natureza patriótica ou relacionados com a especiosa emergência duma alma portuguesa." (cf. id. ibi., p. 9), como uma tendência para a fusão entre contemplação e a paisagem, para sugerir um clima profético e visionário, para o culto da tradição, do misticismo, do génio da raça, do panteísmo e, finalmente, para a valorização da "fisionomia das palavras" (id. ibi., p. 15), isto é, do valor expressivo das próprias formas gráficas.


Capa do n.º 4 (1912) de A Águia.

Paulismo

Movimento literário de vanguarda criado por Fernando Pessoa, cuja designação deriva da palavra "Pauis", com que começa o poema Impressões de Crepúsculo, considerado um texto programático desta estética e que influenciará também composições de Mário de Sá-Carneiro ou Cortes Rodrigues.

Com raízes no Simbolismo e no Decadentismo, o Paulismo caracteriza-se por traços como: o desejo de transmitir impressões vagas e difusas, o recurso frequente à sinestesia, aos pontos de suspensão, à construção tendencialmente nominal da frase ou sintaticamente insólita, à maiusculação de termos, à profusão metafórica, uma tendência para a evocação de paisagens esfumadas e crepusculares, para o esteticismo, para a expressão do tédio, da melancolia e do absurdo.

O Paulismo identifica-se com uma poesia "marcada por um denso envolvimento imaginário, sem que nele se deixe entrever um nexo lógico, devido ao modo como múltiplos pontos de fuga vêm confrontar a sua leitura com o vago, a ampliação significativa, as diversificadas associações ou transposições, a possibilidade de, como disse Pessoa nos seus artigos publicados em A Águia, encontrar em tudo um além" (GUIMARÃES, Fernando - O Modernismo Português e a sua Poética, Porto, Lello, 1999, pp. 69-70).

Intersecionismo


Movimento literário de vanguarda criado por Fernando Pessoa e que se caracteriza pela interseção no poema de vários níveis simultâneos de realidade: a interior e a exterior, a objetiva e a subjetiva, o sonho e a realidade, o presente e o passado, o eu e o outro, etc. Poema paradigmático desta estética, Chuva Oblíqua exemplifica esta técnica de intercalamento que permite "o desdobramento possível de imagens vindas do exterior ou da nossa consciência, de proveniência visual ou auditiva, de experiências reais ou de sonho, etc., criando-se no poema [...] registros ou séries imagísticas objetivamente diferentes, mas devidamente ordenados" (GUIMARÃES, Fernando - O Modernismo Português e a sua Poética, Lello, Porto, 1999, pp.71-72).

Sensacionismo


A teorização do sensacionismo nos escritos de Fernando Pessoa confere ao movimento sensacionista contornos mais vastos que os que definem o Futurismo, reconhecendo neste movimento de vanguarda apenas uma influência, já que o sensacionismo derivaria de três movimentos: do simbolismo francês, do panteísmo transcendentalista português e "da baralhada de coisas sem sentido e contraditórias de que o futurismo, o cubismo e outros quejandos são expressões ocasionais, embora, para sermos exatos, descendamos mais do seu espírito do que da sua letra" (PESSOA, Fernando - Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação, Lisboa, Ática, pp. 134-138).

Representado pela poesia de Álvaro de Campos, que, por seu turno, reconhece em Alberto Caeiro o chefe do movimento sensacionista, o Sensacionismo parte do primado filosófico e estético segundo o qual "a única realidade da vida é a sensação. A única realidade em arte é a consciência da sensação" e baseia-se em três princípios artísticos: 1) o da sensação, 2) o da sugestão, 3) o da construção" (id. ibi., pp.134-138)

Saudosismo, Paulismo, Interseccionismo, Sencaionismo. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2011. [Consult. 2011-04-02].
Disponível na www: .

quarta-feira, 30 de março de 2011

O Guardador de Rebanhos, V

Há metafísica bastante em não pensar em nada.

O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que idéia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?

Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.

Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós, que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?

“Constituição íntima das cousas”…
“Sentido íntimo do Universo”…
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em cousas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.

Pensar no sentido íntimo das cousas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.

O único sentido íntimo das cousas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.
Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!

(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)

Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.

Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.

E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?).
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.



domingo, 27 de março de 2011

PLURAL COMO O UNIVERSO

Banner da exposição: Fernando Pessoa, plural como o universo


O Entrelinhas fez uma visita ao Museu da Língua Portuguesa, onde aconteceu a exposição Fernando Pessoa, plural como o universo.

A mostra explora a vida do escritor português que criou vários "heterônimos", personalidades com biografias e obras poéticas autônomas.

Assistam a esse magnífico vídeo para entendermos melhor o fenômeno Pessoa...

"Se depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia, Não há nada mais simples. Tem só duas datas - a da minha nascença e a da minha morte. Entre uma e outra todos os dias são meus"

Fernando Pessoa/Alberto Caeiro; Poemas Inconjuntos; Escrito entre 1913-15; Publicado em Atena nº 5, Fevereiro de 1925.

A TV Portuguesa fez uma excelente matéria intitulada de Grandes Portugueses. O vídeo a seguir retrata um pouco da história do poeta lusitano...


BREVE BIOGRAFIA

Fernando Pessoa foi morar, ainda na infância, na cidade de Durban (África do Sul), onde seu pai tornou-se cônsul. Neste país teve contato com a língua e literatura inglesa.

Adulto, Fernando Pessoa trabalhou como correspondente comercial, publicando seus primeiro poemas em inglês.

Em 1905, retornou sozinho para Lisboa e, no ano seguinte, matriculou-se no Curso Superior de Letras. Porém, abandou o curso um ano depois.

Pessoa passou a ter contato mais efetivo com a literatura portuguesa, principalmente Padre Antônio Vieira e Cesário Verde. Em 1912, começou suas atividades como ensaísta e crítico literário, na revista Águia.

A saúde do poeta português começou a apresentar complicações em 1935. Neste ano foi hospitalizado com cólica hepática, provavelmente causada pelo consumo excessivo de bebida alcoólica. Sua morte prematura, aos 47 anos, provavelmente aconteceu em função destes problemas, pois apresentou cirrose hepática.

PS: Pessoal, postem qualquer comentário. É vital para célula.Abraços!!!


sábado, 26 de março de 2011

Ricardo Reis


Nasceu em 1887 (não me lembro do dia e mês, mas tenho-os algures), no Porto, é médico e está presentemente no Brasil. É de um vago moreno mate. Educado num colégio de jesuítas, vive no Brasil desde 1919, pois se expatriou espontaneamente por ser monárquico. É um latinista por educação alheia, e um semi-helenista por educação própria. (PESSOA, 2009, p 15).

Mapa astral de Ricardo Reis.

Ricardo Reis é autor de uma poesia neoclássica, austera, melancólica, rigorosa, desencantada com a civilização cristã do século XX e saudosa de um tempo em que os homens exercitavam a objetividade absoluta. Reis é considerado um poeta de filosofia epicurista e estóica, buscando sempre o contentamento sóbrio e a serenidade.

A ressonância da poesia de Reis, “pagão por caráter”, na definição de Campos, traduz-se num estilo denso e construído. Monarquista, educado num colégio jesuíta, latinista e semi-helenista, amante do exato, nas Odes que constrói evidencia um espírito grave, medido, ansioso de perfeição. Como Caeiro, seu mestre, aconselha a aceitar claramente a ordem das coisas. Ambos elogiam o viver campestre, indiferentes ao social, convencidos de que a sabedoria está em gozar a vida pensando o menos possível.

Em força de síntese, dir-se-ia que Ricardo Reis é um heterônimo moderno que cultiva os valores e as crenças do classicismo, procura uma filosofia de vida marcada pela ausência das grandes paixões humanas, pela renúncia parcial do pensamento racional (à imagem de Caeiro), buscando sempre compreender a efemeridade do tempo e da vida e tentando alcançar um estado de serenidade e desprendimento das emoções.

Uma das poesias mais bonitas de Ricardo Reis. Leiam e, logo após, assistam o vídeo no final...

Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos.)

Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
Mais longe que os deuses.

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassossegos grandes.

Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar.

Amemo-nos tranquilamente, pensando que podíamos,
Se quiséssemos, trocar beijos e abraços e carícias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
Ouvindo correr o rio e vendo-o.

Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, e que o seu perfume suavize o momento -
Este momento em que sossegadamente não cremos em nada,
Pagãos inocentes da decadência.

Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-ás de mim depois
sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
Nem fomos mais do que crianças.

E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim - à beira-rio,
Pagã triste e com flores no regaço.


sábado, 19 de março de 2011

POEMA EM LINHA RETA

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.


E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?


Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.